Era uma tarde fria de outono. A chuva caía lá fora, o céu estava cinzento e o silêncio se fazia acolhedor. Uma xícara de café, um livro e um cobertor eram meus companheiros. Sentado no velho sofá de molas, olhei para além da janela, para além do vidro, para além dos prédios. As lembranças que preenchem minha cabeça parecem mais como um filme.

Senti um arrepio gelado na coluna. Pensar em você sempre me causou isso. Mesmo depois de tanto tempo, você possui um efeito entorpecente sobre o meu corpo. Até quando estarei sob esse seu domínio invisível? Não sei.

Levei a xícara até a boca. O cheiro forte do café preto invadiu minhas narinas, e o gosto foi bem parecido. Porém, ele não era o suficiente para te tirar da minha mente. Levantei do sofá, desviei os olhos da janela e fixei-o numa garrafa na estante. Peguei-a e ingeri uma quantidade generosa de álcool. Misturei-o às memórias impregnadas na minha cabeça. 

Senti um ódio crescente no peito. A dor parecia estar aumentando no ritmo que as lembranças iam sendo consumidas. Voltei novamente minha atenção para a janela. Abri uma pequena fresta, sentei no sofá e acendi um cigarro. Uma tragada, um gole. Uma tragada, um gole. Fiz isso por alguns minutos. Inspirei o ar frio. Lentamente, minha mente estava vazia e meu corpo entrava num estado de calma. O cansaço foi me abatendo. Bêbado. De novo. Então era assim que as coisas seriam de agora em diante...

O sono foi pesado. Acordei com lágrimas nos olhos, e aos poucos fui me dando conta do que acontecia comigo. Simples: troquei seu falso amor, por cigarros; e suas mentiras, por álcool. Troquei você, a maior droga da minha vida por outras drogas, que causam bem menos danos ao meu organismo. Essa foi a maneira que encontrei de destruir as lembranças de você; as dolorosas memórias de algo que, ainda não consigo definir, se foram reais ou se apenas imaginei.

Até quando estarei sob esse seu domínio invisível? Não sei. A pergunta sempre paira no ar e some, assim como minha dignidade toda vez que acordo sozinho no sofá com uma garrafa vazia ao meu lado.